quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Café Europa; Emissão #7, de 23-01-2012

Especial destaque: OF THE WAND & THE MOON “The Lone Descent”, Heim010, 2011
1.ª Hora      (<-- download aqui)
1.     THIS MORTAL COIL “Another Day” GB  
2.     ANDRÉA NEBEL “All My Dreams I’m Free” NOR
3.     OTWATM “Sunspot” DIN
4.     OTWATM “Absence” DIN
5.     Ô PARADIS “La Mascara Del Miedo” ES
6.     THE THRESHOLD HOUSEBOYS CHOIR “A Doors Open Into Space“ GB
7.     OTWATM ”A Pyre Of Black Sunflowers” DIN
8.     OTWATM ”Tear It Apart” GB
9.     CHANGES ”Emerald Fire” USA
10. PHASE II ”Revelations” USA
11. OTWATM ”A Tomb Of Seasoned Dye” DIN

2.ª Hora       (<-- download aqui)
1.     OTWATM ”We Are Dust” DIN
2.     OTWATM ”Is It Out Of Our Hands?” DIN
3.     NAEVUS ”Afters” GB
4.     SALLY DOHERTY ”Butterfly” IRL
5.     ALEX FERGUSSON & ROSE MCDOWALL”Let The Sorrow Go” GB
6.     OTWATM ”Watch The Skyline Catch Fire” DIN
7.     OTWATM ”Immer Vorwärts” DIN
8.     SPIRITUAL FRONT ”Odete” IT
9.     BALLO DELLE CASTAGNE ”La Foresta Dei Suicidi” IT
10. SIEBEN ”Build You a Song” GB
11. OTWATM ”A Song For Deaf Ears In Empty Cathedrals” DIN
12. OTWATM ”The Lone Descent” DIN
13. ROY HARPER ”Another Day” GB
Of The Wand & The Moon
Of The Wand & The Moon
(Photos by Mr. Lee is Free)

CAFÉ EUROPA apresenta: OF THE WAND & THE MOON “The Lone Descent”, Heim010, 2011

Apanágio da mudança constante, também entre os círculos musicais que todos julgavam imutáveis, os últimos dois anos têm sido pródigos em lançamentos que atestam o que muitos pretendem adiar – o desaparecimento gradual daquilo a que se chamou desde há mais de 20 anos de dark folk, folk noir, ou folk apocalíptico, e que caracterizou parte da música popular moderna ocidental desde os finais da década de 80.
Quer isto dizer que a folk music, tal qual a conhecemos, acabou?
É claro que não, uma vez que faz parte da intemporal memória colectiva ancestral dos povos.
Mas aquela franja de criadores de pouca técnica mas grandes ideias, depois de ampliada na imitação até quase à exaustão, libertou-se da sua pele, arranjou uma segunda, bem mais vistosa, mais resistente e decididamente mais transversal – ou a caminho de o ser.
Se pensarmos por um minuto nos muitos discos recentes em que Tony Wakeford, dos Sol Invictus, esteve envolvido, nos últimos 4 álbuns de originais de David Tibet com os renovados Current 93, na radical mudança que Douglas Pearce operou nos dois últimos Death in June, enfim, operações que se estenderam a outros nomes importantes da cena folk de costela industrial, como Blood Axis, Der Blutharsch, Allerseelen, quase todos eles se conseguiram libertar do estigma confrangedor dos dois acordes abertos!!!
O dinamarquês Kim Larsen e o seu projecto pessoal OF THE WAND AND THE MOON (OTWATM) está seguramente entre eles, aliás, se calhar já um pouco acima.
Larsen levou 6 anos a lançar o sucessor de “Sonnenheim”, um duplo álbum na sua edição de vinil, um disco que coroava outra meia dúzia de anos em que produzira 3 interessantes álbuns, mas que seriam presa fácil da acusação de minimalismo folk.
O disco terá de resto causado tal impacto junto das primeiras fileiras dos defensores do género, que relançou no ar a marca OTWATM como um dos bastiões irredutíveis do folk noir tradicionalista, mesmo vindo da Dinamarca.
Com a passagem dos anos, Larsen expressou-se também através do sidekick Solanaceae, por vezes como se quisesse recuperar os ambientes folk ancestrais mais fiéis a “Nighttime Nightrhymes”, seu 1º disco que já datava de 1999!
Este desdobramento acabou por trazer, não uma fragmentação ou dispersão da sua criação, mas antes um inquestionável reforço.
Em 2011, “The Lone Descent”, de novo em nome de OTWATM, afirma claramente as tendências que referíamos atrás, a da suave mudança associada a um franco crescimento, enquanto compositor de canções maiores; não significa isto, um alinhamento tardio com ditames pop, porque decerto OTWATM nunca fará parte de playlists da rádio mainstream – e tê-los por cá é só mais exemplo do esforço recompensado da crença nas ideias, muito para lá das aparências!
The Lone Descent” está impregnado da grandiosidade de arranjos que em tempos caracterizou a escrita de velhos monstros sagrados como Van Dyke Parks, Brian Wilson e, numa vertente mais visceral, Lee Hazlewood e Serge Gainsbourg, daí a saudável e bem-humorada confusão, atraída pelo leitmotiv que promovia no Outono o álbum de Kim Larsen e companhia, como se fosse possível descaracterizar em 3 tempos uma já longa carreira de 15 anos.
Percebe-se a referência, mas contorna-se a desnecessária analogia directa – Kim Larsen permanece um songwriter dos espaços de recolhimento, arauto de verdades que não se deixam incendiar pelo fogo que maneja com distância e mestria.
Se tivéssemos que destacar um só tema que fosse, estaríamos em maus lençóis – e não será esta uma risível desculpa de mau ouvinte.
As canções folk de luxo sucedem-se umas atrás das outras, envoltas em roupagem de estúdio talhada à medida, com uma sábia utilização de teclados e guitarras que, só por momentos, podem trazer à memória os trabalhos mais acetinados da década de 90 dos Death in June (But what ends… e Rose Clouds), mas isso não será argumento suficiente para o acusar de seguidismo!
E quando tudo já parece conquistado com os seis temas dos lados 1 e 2, assim que os primeiros 25 segundos do lado 3 nos fazem levantar e verificar as rotações do prato, somos detidos pela obscura dinâmica majestática de “A Tomb Of Seasoned Dye”, avalanche emotiva onde se reaprende a ouvir canções com ganchos em nome do amor à música e à canção popular.   
Não é fácil ponderar um entusiasmo derivado do prazer auditivo de alinhar antes temas como “Sunspot”, “A Pyre Of Blacksunflowers” ou “Tear It Apart”, mas o segundo disco de “The Lone Descent” carrega ainda mais impiedosamente sobre a sensibilidade do ouvinte, e na sequência do quase ritualismo sinfónico de “Is It Out Of Our Hands”, Larsen surpreende tudo e todos com um tema que poderia voar sobre a skyline de Nashville, exactamente “Watch The Skyline Catchfire” , “… a distant memory before I go to sleep”.
Em quase todas as canções de “The Lone Descent”, a marca da experiência e do enriquecimento artístico, talvez um dos exemplos que comprovam a nossa premissa, com que abrimos esta reflexão sobre o novo OTWATM – não sabemos que novo rei-sol nasceu na música moderna, popular ou não, não nos interessam já os rótulos e não nos ficamos por aparencias, por muito sugestivas de autenticidade que possam parecer.
Mas, “The Lone Descent” é uma obra rica, una e indivisível no panorama actual que procuramos – quis a ironia do destino que fosse assinado, como diria Sophia, pelo Cavaleiro da Dinamarca… um músico com quem em tempos tivemos o gosto de dialogar, sempre cauteloso com as palavras mas certeiro na sua intenção. “The Lone Descent”, como decerto já perceberam, é o seu melhor trabalho até ao presente.
(Texto de João Carlos Silva)

Tracks
1 : Sunspot
2 : Absence
3 : A Pyre Of Black Sunflowers
4 : Tear It Apart
5 : We Are Dust
6 : A Tomb Of Seasoned Dye
7 : Is It Out Of Our Hands?
8 : Watch The Skyline Catch Fire
9 : The Lone Descent
10 : Immer Vorwärts
11 : A Song For Deaf Ears In Empty Cathedrals

Produced, written and performed by Kim Larsen
At Soundscape Studios, Copenhagen
Engineered by Louise Nipper
Mastered by Flemming Hansson Jr at Sweep Mastering
Booklet artwork front, back and middle pages by
Alex Rose
Add. Musicians :
John Murphy : Add. Drums (1, 6, 9)
Soma Allpass : Cello (3, 6, 7, 8, 9, 11)
Anne Eltard : Violin (3, 6, 11)
Louise Nipper : vocals (1, 5, 6, 9)
Lorenzo Woodrose : vocals (3, 5)
Aron : vocals (5)
Louise Wilk-Zerahn : vocals (11)
Simon roland pedersen : vocals (11)
Esben Tind : cello (8)
Bo Rande : trumpet (2, 3) Omnichord (2)
John van der Lieth : whisper (3)
Irma Balciunaite : whisper (11)
Niels Rønne : Piano outro (11)

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Café Europa: Emissão #6, de 16-01-2012

Especial destaque: Compilação Old Europa Café 100, Box 7CD, 2008
1.ª Hora     (<-- download aqui)
1.    BAUHAUS “Third Uncle” GB  
2.    TUXEDOMOON “Never Ending Story” USA
3.    VON MAGNET “New Rage” FR
4.    VIRGIN PRUNES “Caucasian Walk” IRL
5.    NOX “A.V.D.” FR.
6.    MZ.412 “Overthrowing European Christianity“ SUE
7.    D.B.P.I.T (Der Bekannte Post-Industrielle Trompeter) “Lili Marlene” IT
8.    A CHALLENGE OF HONOUR Iberia NL
9.    CIRCUS JOY ”Signora Europa” IT
10. EGIDA AUREA ”L’Ardente Fiaccola Della Ragione” IT
11. VOX POPULI! ”Soft entrance to nature’s camino de luz” IT
12. ARGINE ”Risveglio” IT

2.ª Hora    (<-- download aqui)
1.    SEELENLICHT ”Return to Summerisle” DE
2.    POST CONTEMPORARY CORPORATION ”Il Martirio di Wagner (live attack!) IT
3.    SPIRITUAL FRONT ”Funeral Blues” IT
4.    FOREIGN TRADE ”With You” USA
5.    ORGANISATION TOTH ”Follow the L.ight O.V.E.uropa” FR
6.    ARTEFACTUM ”The Night Waltz in ViennaPOL
7.    H.E.R.R. ”A Newer Rome (2007 Version)” NL
8.    SELFISHADOWS ”Poison” IT
9.    TEARS OF OTHILA ”Up our Banners ! (Special Old Europa version)” IT
10. THE LINDBERG BABY ”No Promises” USA
11.  ROME “Ballots and Bullets” LUX
12.  LOVAC “Filth Of A ParadiseSUE
13.  NARSILION “Derperta Ferro” ES
14. TWELVE THOUSAND DAYS “The Moon Is Down” GB
15. BRIAN ENO “Third Uncle” GB 

Von Magnet @ FadeIn, Leiria














Narsilion @ Festival Gótico FadeIn, Leiria

(Photos by Ângelo Fernandes)

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Café Europa: Emissão #5, de 09-01-2012

Especial destaque: CAFE DE L'ENFER "Marchant à Quatre Pattes au-devant de la Rédemption" Digipak CD 2011, Steinklang Industries.
1.ª Hora  (<-- download aqui)  
1.    WALKER BROTHERS “First Love Never Dies” USA  
2.    ANTONY “Cripple And The Starfish” USA  
3.    ORCHESTRA NOIR “Bedlam” GB
4.    CAFÉ DE L’ENFER “Je Ne Veux Plus Être Pieux” AUS
5.    CAFÉ DE L’ENFER “La Fôret Obscure” AUS
6.    STORMFÅGEL Den BergtagnaSUE
7.    STORMFÅGEL “Untitled” SUE
8.    CAFÉ DE L’ENFER “L'Évanescence De Toutes Les Possibilités” AUS
9.    CAFÉ DE L’ENFER “Marchant à Quatre Pattes au-devant de la Rédemption” AUS
10.  IANVA “In Compagnia Dei Lupi” IT

2.ª Hora    (<-- download aqui)
1.    WHILE ANGELS WATCH “Eye For Eye” FR
2.    KANNONAU “Addio!” IT
3.    CAFÉ DE L’ENFER “L'Automne” AUS
4.    CAFÉ DE L’ENFER “Messaline” AUS
5.    HEKATE “Unser Die Welt, Trotz Alledem” DE
6.    CAFÉ DE L’ENFER “Les Tristes Circuits” AUS
7.    CAFÉ DE L’ENFER “À Six Mille Milles” AUS
8.    ROSE ROVINE E AMANTI  “Paura Del Demonio” IT
9.    ROMA AMOR “La Belda” IT
10.  ONIRIC “Cabaret Syndrome – Blessing” IT
11.  SPIRITUAL FRONT  “First Love Never Dies” IT

Café Europa apresenta: Café de L'Enfer "Marchant à Quatre Pattes au-devant de la Rédemption" Digipak CD 2011, Steinklang Industries

A temática erótica e hedonista do projecto Café de L’Enfer, enquanto diminuto véu transparente disposto sobre a referência explícita dos termos, consegue garantir às canções presentes no álbum “Marchant à 4 pattes au devant de la redemption” um magnetismo para a nossa concupiscência. Se o projecto, actualmente residente na Áustria, tem origens francesas, melhor se enquadra no revivalismo estético e artístico desse fim do século XIX, em que existiu mesmo em Paris um café cabaret com esse nome – Café de L’enfer, com uma sumptuosa fachada e decoração escultóricas verdadeiramente vertiginosas e assombrosas, monumentos à perdição humana, isenta de quaisquer lastros morais.

Situado em Pigalle, Place Blanche, Boulevard de Clichy, nas vizinhanças do Moulin Rouge, e onde hoje se encontra ironicamente, um hipermercado MonoPrix, para além da voluptuosa e macabra decoração, o Café de L’Enfer exibia frequentemente uma programação cuja temática se adivinhava pela sugestiva descrição dos seus conteúdos.
“Todas as noites das 8.30 às 2 da manhã – atracções diabólicas : Suplício dos malditos; Ronda dos condenados, A FORNALHA, a metamorfose dos malditos, etc. etc. , …”

Se não fosse pelo internacionalmente reconhecido requinte parisiense em exaltar a decadência elegante no entretenimento nocturno, e poder-se-ia confundir esta temática por qualquer outra coisa… De resto, tudo se encaixava perfeitamente no espírito da época, no primeiro grande apogeu da Revolução Industrial, da nova escravidão aos assomos pretensiosos de uma civilização dita superior afundada na mais negra depressão de absinto, civilização assoberbada que Eça de Queirós tão fielmente retrata nos episódios parisienses de A Cidade e as Serras.

De volta ao século XXI, - e não querendo generalizar conclusões precipitadas – o pano de fundo parece ser o mesmo, apenas com novas roupagens e gadgets de mise en scène, mais fáceis de usar que a mesa articulada de Jacinto . Perante um novo apogeu decadentista – desta vez neo-liberal e financeiro…- estamos de novo a marchar a 4 patas de fronte da redenção.
Por seu lado, o movimento musical neo-clássico e decadentista que se iniciou na Europa Unida por altura da queda de um dos seus mais notórios símbolos de separação, sugere estar cada vez mais próximo do momento do seu saudosismo – paradoxalmente!...
A música de Marchant a 4 pattes au devant de la redemption  dos Café de L’enfer parece anunciar a antecâmara da futura desunião, em que após a dissolução das instituições socioeconómicas soçobrará mais fundo a fundamentação ética, sempre sob pano de fundo hedonista. Não nos queremos deitar a adivinhar, mas parece-nos que há mais intenções por detrás da simples reposição histórica! Musicalmente, a toada neo-clássica é decorada por texturas e rítmicas pós-industriais, aqui e ali mais militaristas mas nunca alinhando no marcialismo estéril de alguns projectos musicais europeus recentes.

Há uma constante vontade de condimentar o programa do novo Café de L’enfer com laivos cinematográficos e como se não bastasse, num dos temas, (Messaline) surge impecável a narrativa na voz do actor australiano Max Wearing, membro honorário dos Death in June. As vozes principais, masculina e femininas, estão também perfeitamente enquadradas nos cânones do género, expressivas e carregadas de intensidade dramática, se bem que transmitindo alguma força de determinação naquilo que é o ponto fulcral da sua temática, a vontade permanente da rebelião de costumes, do hedonismo, da exaltação da volúpia, como manifesto supremo da essência humana. Tudo o que foi dito sobre Baudelaire, de Sade e Isidore Ducasse, faz-se repetir aqui, se bem que ainda estamos no domínio da literariedade, duma refinada ficção baseada, isso sim, em factos reais.

Haverá apenas a referir como ponto fraco do álbum uma certa colagem a memórias como a dos Elend, Regarde Extrême ou a dos saudosos Eros Necropsique, ou mesmo certas passagens recordando Les Affres de la Mort, talvez pela entoação vocal, mas não é mester desta passagem no Café Europa assentar a sua divulgação sobre analogias, como as que terão de imediato apontado referências outras como Les Joyaux de la Princesse ou Dernière Volonté, a nosso ver bem longe da mouche.

Há um uso imenso de teclados, o que por si só não é crime – sê-lo-ia se fossem mal utilizados, o que não é o caso, só que estaria provavelmente mais que na hora de renovar soluções para este género musical que só pode viver da verosimilhança; por vezes quando a recriação autêntica de ambientes não é possível, por implicar o uso de orquestras ou de instrumentos de orquestras reais, cujo domínio não estará ao alcance de todos, por isso mesmo, assistimos nas duas últimas décadas à amostragem massiva sem preconceitos de excertos orquestrais clássicos e contemporâneos, que parecem aqui ter sido evitados em nome da originalidade. Em suma, um balanço equilibrado e positivo, num álbum que, se calhar felizmente, não colherá maioritariamente à primeira. É bom não esquecer a qualidade dos discos que vão crescendo com o tempo, desconfiando, enfim, só um pouco, das conquistas coup de foudre, de combustão espontânea. Dentro de meses, confirmaremos ou não se se trata deveras de uma das melhores promessas vindas da Europa em tempos mais recentes – resta aos cínicos atestar que isso não é afinal de contas muito difícil, porque a Europa não está longe de ser de novo um inferno…
Texto de João Carlos Silva