quinta-feira, 27 de março de 2014

Café Europa Radio Show #115, 27-MAR-2014

01. CAMERATA MEDIOLANENSE - "Der Tod" (IT) (madrigali - 1999)
02. PROPAGANDA - "Dream Within A Dream" (GER) (a secret wish - 1985)
03. SOPOR AETERNUS - "The Oblong Box" (GER) (poetica - 2013)
04. SOPOR AETERNUS - "Dreamland" (GER) (poetica - 2013)
05. SOPOR AETERNUS - "Eldorado" (GER) (poetica - 2013)
06. GAE BOLG AND THE CHURCH OF FAND - "La Muete” (FR) (la ballade de l'ankou - 2002)
07. SEVEN PINES - "Lvresse Quotidienne" (FR) (nympholept - 2003)
08. SOPOR AETERNUS - "The Sleeper" (GER) (poetica - 2013)
09. SOPOR AETERNUS - "Alone 1" (GER) (poetica - 2013)
10. SOPOR AETERNUS - "The Conqueror Worm" (GER) (poetica - 2013)
11. SOPOR AETERNUS - "Alone 2" (GER) (poetica - 2013)
12. CORDE OBLIQUE -"Heraion" (IT) (per le strade ripetute - 2013)
13. CORDE OBLIQUE - "Averno" (IT) (per le strade ripetute - 2013)
14. SOPOR AETERNUS - "The City In The Sea" (GER) (poetica - 2013)
15. SOPOR AETERNUS - "The Oblong Box 2" (GER) (poetica - 2013)
16. SOPOR AETERNUS - "The Haunted Palace" (GER) (poetica - 2013)
17. BARBAROSSA UMTRUNKT - "Walvater" (FR) (der talisman des rosenkreuzers - 2012)
18. BARBAROSSA UMTRUNKT - "L'Empire Du Milieu" (FR) (la fraternité polaire - 2013)
19. SOPOR AETERNUS - "A Dream Within A Dream" (GER) (poetica - 2013)

Cafe Europa apresenta: Sopor Aeternus & The Ensemble Of Shadows ‎– "Poetica", Apocalyptic Vision, 2013

O colectivo gótico alemão SOPOR AETERNUS AND THE ENSEMBLE OF SHADOWS lançou no outono passado mais um disco de originais, o décimo primeiro para ser mais exacto, “Poetica”, todo ele dedicado à poesia de Edgar Allan Poe, e mais concretamente, à colectânea “The Raven and Other Poems”, ousadia já várias vezes arriscada por gente tão díspar como Alan Parsons, os Propaganda, os Manilla Road e Lou Reed, entre muitos outros. O grande vulto da literatura norte-americana não é propriamente novidade na discografia do grupo de Anna Varney Cantodea – antes já tinha sido abordada a sua poesia em discos como “Todeswunsch” e “Dead Lovers Sarabande”, mas apenas em temas soltos. Neste “Poetica” encontramos toda uma recolha que se encaixa na perfeição na estética desta estranha agremiação germânica que há pelo menos um quarto de século se inscreveu na órbita saturnina da música moderna de intensos (e óbvios) traços góticos.
Embora as edições dos SOPOR AETERNUS se tornem cada vez mais alvo da atenção dos grandes colecionadores pela exuberância do seu acabamento formal, também é certo que os lançamentos se tornaram ultimamente mais esparsos. Se lembrarmos discos essenciais que constituem memória recente no acervo criativo dos SOPOR AETERNUS, tais como “La Chambre D’Écho” ou “Les Fleurs du Mal”, apercebemo-nos de que muita coisa se passou entretanto e de que estes trabalhos fulcrais no panorama europeu estão já a alguns anos de distância, embora a sua pertinência se mantenha inalterável.
A riqueza musical dos SOPOR AETERNUS pode traduzir-se em duas palavras – morbidez e sensualidade. Conquanto que esta associação possa soar perigosa ou passível de grosseiros mal-entendidos, terá sido esta a constante ao longo destes anos todos. Anna Varney é mestre em compor narrativas mediúnicas, como se tudo o que envolve as suas criações se passasse sempre entre o sofrimento do presente obscuro e uma inquietude na eternidade do além-túmulo que remete de imediato para a ideia de um constante e avassalador estado de suspensão de alma, de punição e de limbo. No entanto, e apesar da, por vezes, sufocante atmosfera desenvolvida, parece sempre existir, digamos, não uma esperança, mas um consolo masoquista no eterno sofrimento dos danados. A alma humana tem essa prodigiosa elasticidade de se habituar ao padecimento de uma vida e para além dela, e nesse campo elísio Anna Varney está entre os seus melhores intérpretes.
Ao escolher a referência por excelência da poesia feita elegia como Edgar Alan Poe, basicamente a entidade geradora da noção do conto e do poema góticos, os SOPOR AETERNUS não podiam estar mais a jogar “em casa” – e assim os temas fluem naturais, quase imediatos, na associação música-letra. Com efeito, e após o intro de pouco mais de um minuto, com a primeira parte de “Oblong Box”, tema recorrente neste álbum mas sem palavras, até porque não era originalmente um poema mas um conto de Poe, surge a adaptação de “Dreamland”.
Assim que soam as primeiras notas e num andamento lento, somos imediatamente confrontados com a ambiência clássica de uma ghoststory.Há madeiras a ranger, há ventos a uivar, enquanto os teclados lúgubres acompanham o incauto e mesmerizado visitante do poema incluso em “The Raven and Other Poems” por essas paisagens plenas de contrastes que arrastam a alma para um deslumbramento mórbido.
São quase quinze minutos que podem ser escutados em loop, tal a envolvente conseguida, rara proeza de vates e bardos – tornar o tempo de uma longa peça quase impercetível para o ouvido mundano, habituado a navegar em vetustas jangadas da imediatez. Sendo apenas o segundo tema do alinhamento, e tendo em conta que os quase 80 minutos aproveitáveis do formato cd foram inteiramente preenchidos com os onze temas, constatamos facilmente que outras extensas peças nos cruzarão o caminho nesta descida aos mais deslumbrantes abismos da imaginação poética. Tal como no título…
A versão seguinte é a do fantástico “ElDorado”, a história do cavaleiro que envelhece na senda do mítico lugar até que, calvo e quase esgotado, encontra outro cavaleiro sombrio a quem indaga sobre o Eldorado, obtendo apenas a resposta de que ainda fica para lá das Montanhas da Lua, e depois descendo o Vale das Sombras… não há muito a dizer para além do que a composição nos pode impressionar – talvez uma fugaz manifestação da incrível versatilidade dos SOPOR AETERNUS AND THE ENSEMBLE OF SHADOWS, um tema que parece encavalitar ritmicamente sobre penedos e florestas agrestes e que se perde no horizonte por entre laivos momentâneos de musicalidade hispânica.
Um exemplo do valor da arte maior do grupo de Anna Varney, e que espevita o interesse desta abordagem, adensando o clima de mistério que logo segue em frente com “The Sleeper”, de resto um dos melhores escritos de Poe incluído na referida coletânea de poemas lançada em 1845. O lamento do sujeito poético na cripta onde jaz a beleza da amada, eternamente em descanso velado por anjos, parece ser premonitório do que aconteceria ao próprio Poe quando a sua primeira esposa Virginia Clemm, catorze anos mais nova, morre na flor da idade.
À parte alguma previsibilidade que pode decorrer da temática quase ultra-romântica antes do tempo, dado que Poe é contemporâneo da primeira vaga do Romantismo de sabor gótico, além do mais, no Novo Mundo, a adaptação do tema pelo coletivo alemão é de tal forma sugestiva e quase cinematográfica, que dificilmente vislumbramos outro modo de o musicar – uma espécie de desfile fúnebre, ocasionalmente pontilhado por motivos patéticos que traduzem o estado próximo da loucura do que se prostra junto da pira tumular e encomenda extático a beleza imóvel no sono perpétuo à proteção divina, prece tão bem traduzida pelas frases melódicas do sintetizador que parece refletir o som da eternidade. E mais uma vez, assim passámos onze minutos…
O tema seguinte é o fabuloso “Alone”, que terá mais à frente um contraponto instrumental de mais de sete minutos, aspecto que, apesar de irrepreensivelmente executado, poderá ser um ponto fraco no alinhamento do álbum, visto mesmo como “filler”, já que esta primeira parte é praticamente perfeita – o poema que fechava o alinhamento de “The Raven” e no qual o poeta adivinha finalmente na sua originalidade, na sua unicidade e obstinada individualidade, uma maldição que o atormenta desde a infância, como uma nuvem negra tornada demónio sempre presente na sua visão. Nunca será demais sublinhar a particular força interpretativa a qual Anna Varney se entrega totalmente nesta adaptação de “Alone”.
Entretanto, entrámos já na macabra “The Conqueror Worm” – animada pelo contraste de uma toada mais gothic-pop, Varney reinterpreta a saga do pobre corpo humano que sem vida se rende ao verme conquistador. Neste tema de porte médio, comparativamente às peças de resistência incluídas em “Poetica”, tem-se igualmente a visão de conjunto da herança gótica que os SOPOR AETERNUS carregam, e que tanto pode fazer referência aos CHRISTIAN DEATH da fase intermédia ainda com Rozz Williams, como pode mesmo recuar mais no tempo e citar KLAUS NOMI, obviamente menos o esplendor histriónico operático, mas com a mesma carga de ironia sobre a condição humana, simultaneamente sarcásticos e apaixonados pela forma e conteúdo da criatura mais complexa do planeta.
Tudo passa e assim passa a versão instrumental de “Alone”, na sua beleza estrutural e no seu acervo técnico, música para tertúlias solitárias à lareira, no silêncioda noite invernal – não seria estritamente fundamental, mas como acontece sempre com os SOPOR AETERNUS, tem aquele ingrediente quase hipnótico e macabro que não nos deixa afastar nem olhos nem ouvidos…
O alinhamento do álbum desenvolve para o seu terço final e a atmosfera inicial opressora de “The City In The Sea” deixa adivinhar mais um pedaço de pesadelo nos seus mais de dez minutos. Sem dúvida um dos mais perturbantes poemas de Poe e um dos melhores neste alinhamento de tributo que Anna Varney e restantes companheiros conseguem repor, com inegável mestria, recontando a cidade que a Morte moldou em recônditas paragens marítimas, onde nenhuma luz divina rebrilha, descrição fantástica do imaginário reino dos mortos, que por fim o Inferno, emergente de mil tronos, vem reclamar numa onda gigante de vermelho sangue. A interpretação de Anna será aqui de longe a melhor, num estado de transe em que a cegueira do pavor vê mais fundo que a frieza racional do literato, tornando este momento de “Poetica” verdadeiramente inspirador e revelador da cíclica grandeza dos escritos de Edgar Alan Poe, que só pode ser considerado mesmo um emissário tradutor de uma potestade de dimensão universal.
Depois da segunda parte do curto instrumental “The Oblong Box”, surge a adaptação de “The Haunted Palace”. Outra longa peça de dez minutos e uma superior reposição do poema fortemente cinematográfico (50 anos antes do cinema!), onde Poe fala sobre um maravilhoso palácio e dum monarca em tempos bem-aventurado, cujos domínios, contaminados por “vestes de sofrimento” e ignomínia, se tornaram com o tempo num lúgubre lugar de maldição.
Aqui, mais uma vez, o ensemble de músicos de escol, à volta de Varney, assoberbam-se com justeza para construir uma narrativa sublime que sustem de modo incomparável a imaginação do ouvinte, nos últimos minutos deste excelente disco do ano passado que vai fechar com “Dream Within A Dream”, que os compatriotas alemães PROPAGANDA já tão bem tinham repegado há praticamente 30 anos, e, embora não seja de longe a melhor faixa de “Poetica”, Anna Varney e os SOPOR AETERNUS conseguem mais uma vez encontrar o portal de passagem para o mundo espectral de Poe.
Digamos de passagem que a versão dos PROPAGANDA continua por assim dizer imbatível, mas atendendo ao que o grupo de Varney alcançou nas interpretações que ficam atrás, justiça lhes seja feita que merecem a distinção e o nosso voto de confiança.
Sobre Edgar Alan Poe, já foi tudo dito e feito, mas contudo haverá sempre essa urgência de lhe agradecer os ensinamentos de, através da poesia e narrativa fantásticas, termos a obrigação de entender que a vida e a morte estarão sempre de mãos dadas na dimensão da criação literária, e que por esta poderemos esculpir da maneira que melhor nos agradar, o horror ou a felicidade de conhecermos a ambas de forma intensa e vivida.
Quanto aos alemães SOPOR AETERNUS, e ao cabo de 25 anos em que Anna Varney nos ensinou que o pranto também pode ser uma forma de cantar sublime, só nos resta reconhecer a sua importância da música moderna europeia, vulto negro admirável que como uma velha árvore quase moribunda, se impõe majestosamente no centro geográfico de uma longa tradição de histórias de horror, mistério e, acima de tudo, Imaginação. 

Café Europa Radio Show #114, www.warfareradio.com 20-MAR-2014

01. AIN SOPH - "Tutti A Casa!" (IT) (aurora) - 2002)
02. CALLE DELLA MORTE - "Nevi Eterne" (IT) (v.a. - tutti a casa ain soph tribute - 2003)
03. ARGINE - "Datemi Pace" (IT) (v.a. - tutti a casa ain soph tribute - 2003)
04. MEREDITH MONK - "Scared Song" (USA) (do you be - 1987)
05. HENRY PURCEL (by John Eliot Gardiner) - "Prelude While Cold Genius Rises / What Power Art Thou" (GB) (king arthur - act 3 - 1985)
06. DAGMAR KRAUSE - "Barbara Song" (GER) (supply & demand  / songs by brecht / weill & eisler
- 1986)
07. DIAMANDA GALAS w. JOHN PAUL JONES - "The Sporting Life" (USA) (the sporting  life - 1994)
08. LYDIA LUNCH w. ROWLAND S HOWARD - "Burning Skulls" (USA/AUS) (shotgun wedding - 1991)
09. NOX - "AVD" (FRA) (crowd - 1988)
10. SWANS - "The Seer Returns" (USA) (the seer - 2012)
11. THE EX AND TOM CORA - "Fire And Ice" (NED/USA) (scrabbling at the lock - 2009)
12. GAË BOLG AND THE CHURCH OF FAND - "La Marche Des Morts" (FRA) (john barleycorn must die - 2000)
13. CURRENT 93 - "Why Did the Fox Bark?" (GB) (i am the last of all the field that fell - 2014)
14. HAR BELEX - "Pathways" (ESP) (time does not forgive ep split w. fragile - 2014)
15. CORDE OBLIQUE - "Due Melodie" (IT) (per le strade ripetute - 2013)
16. EGIDA AUREA - "Il Forziere Dei Ricordi" (IT) (derive - 2012)
17. LIA FAIL - "Drown By Faith" (IT) (v.a. gaderung - a tribute to sixth comm - 2013)
18. HEATHEN APOSTLES - "Dark Was The Night" (USA) (boot hill hymnal - 2013)
19. NIEMANDSVATER - "Der Tanzende Stern" (GER) (zeitenlos - 2012)
20. KENTIN JIVEK - "Futurition" (FRA) (futurition - 2014)
21. PALE ROSES - "After Forever" (FRA) (offerings - 2013)
22. PINK FLOYD - Julia Dream" (GB) (BBC archives 1967/1969 - 2011)
23. MICHAEL GIRA - "Mosquito Coast" (USA) (solo recordings at home - 2001)
24. PROJECTO YESTERDAY - "Destruction" (PT) (the waiting - 2014)
25. THE JAPANESE GIRL - "A Tea With Twiggy Kasumi" (PT) (a tea with twiggy kasumi - 2013)
Michael Gira (Swans)
(Photos by A.F.)
David Tibet (Current 93)

quinta-feira, 20 de março de 2014

Café Europa Radio Show #113, 13-MAR-2014 www.warfareradio.com

01.SANGRE CAVALLUM - "Barbara Carmina AC" (PT) (barbara carmina  - 2004)
02.SANGRE CAVALLUM - "Fero, Bravo e Forte" (PT) (barbara carmina  - 2004)
03.SANGRE CAVALLUM - "Primabera dos Bombos de Pedra" (PT) (patria granitica - 2006)
04.STURMPERCHT - “Der Schlafende Kaiser" (AUT) (bergentruckt - 2013)
05.STURMPERCHT - "Die Drei Eisheiligen" (AUT) (bergentruckt - 2013)
06.STURMPERCHT - "Vierâugl" (AUT) (bergentruckt - 2013)
07.STURMPERCHT - "Die Hochzeitstafel" (AUT) (bergentruckt - 2013)
08.KARNNOS - "Land Of Stags" (PT) (deatharch crann - 2000)
09.KARNNOS - "Ruins And Terror" (PT) (dun scaith - 2002)
10.KARNNOS - "The Womb Of The Forests" (PT) (undercurrents and lost horizons - 2005)
11.STURMPERCHT - "Die Dreizehnte Percht" (AUT) (bergentruckt - 2013)
12.STURMPERCHT - "Das Letzte Licht" (AUT) (bergentruckt - 2013)
13.STURMPERCHT - "Der Wildalpgeist" (AUT) (bergentruckt - 2013)
14.ARDE FERO - "Vira Boi! Arre Boi!" (PT) (achega solar - 2011)
15.ARDE FERO - "Arriba da Serra Albora" (PT) (arriba da serra albora - 2014)
16.ARDE FERO - "Siga a Ronda" (PT) (siga a ronda - 2013)
17.STURMPERCHT - "Das Wutend Heer" (AUT) (bergentruckt - 2013)
18.STURMPERCHT - "Die Ubergossene Alm" (AUT) (bergentruckt - 2013)
19.STURMPERCHT - "Winterstille" (AUT) (bergentruckt - 2013)
20.ÀRNICA - "Piel de Tambor" (ESP) (piel de tambor 7" - 2013)
21.STURMPERCHT - "Der Bauer Und Der Wuch'rer" (AUT) (bergentruckt - 2013)


quinta-feira, 13 de março de 2014

Café Europa apresenta: STURMPERCHT‎ – "Bergentrückt", Percht 22, 2013

Já são pelo menos dez anos a acompanhar as diabruras dos caretos alpinos que dão pelo nome de STURMPERCHT, aparentemente liderados pelo espírito empreendedor dum homem de inesgotável fôlego e imparável criatividade, chamado Markus Presch. Max, como é conhecido na Europa e nalguns lugares do mundo, é também o homem por detrás de vários projetos da nova música germânica, de diferente natureza, onde se incluem os lendários industrialistas Rasthof Dachau, os Men Behind the Sun, os ARS e, ainda, colaborações e produção com os colegas de acearia Stahlwerk 9 / Indigo Larvae, os Atrox, entre outros pertencentes ao selo austríaco Steinklang Industries, sediado em Salzburg e do qual Max é obviamente o patrão, à volta do qual nasceram, naturalmente, selos subsidiários como a Ahnstern, onde os compatriotas Allerseelen de Gerhard Hallstat são a atração principal, além de outros projetos de folk alpino primitivo ou de fusão industrial / psicadélica, assim como o próprio selo Percht de onde vêm os discos dos Sturmpercht.
Com os STURMPERCHT, Max e os companheiros de algazarra campestre e montanhista revivem a longa tradição folk dos Alpes, inicialmente, estritamente ligados ao espírito volkisch iniciático que animava as bandas irmãs como os Allerseelen, Waldteufel ou os próprios Der Blutharsch, que descendiam dos The Moon Lay Hidden Beneath A Cloud, mas depois ganhando uma identidade própria, demarcando-se portanto dos tiques que certas cliques de admiradores lhes podiam eventualmente conferir, acarretando-lhes os habituais e costumeiros mal-entendidos político-ideológicos, geralmente ateados por sites alarmistas e difusores de mentiras como o célebre “Who Makes the Nazis”.
Desse modo folião e grotesco, os STURMPERCHT foram-se tornando num valor seguro na cena musical europeia, reunindo simultaneamente genuíno amor às raízes tradicionais da cultura dos montes, e uma enorme dose de humor que resume a essência do espírito Perchten, em tudo semelhante ao dos nossos caretos transmontanos. Aliás, Max Presch muda de nome cada vez que agremia mais uma batida conjunta dos STURMPERCHT, passando muito naturalmente a chamar-se Max Percht.
De volta à discografia dos Sturmpercht, os últimos anos foram recheados de lançamentos marcantes, entre EP’s, álbuns e compilações, com especial destaque para dois álbuns essenciais como “Geister Im Waldgebirg” de 2006,  e “Schattenlieder” de 2009, dois discos duplos que assumem na sua edição em vinil uma espécie de compêndio básico para os recém-chegados a estas paragens musicais. Depois de um interregno de quatro anos, surge no final de 2013 mais um disco de originais, numa caixinha de madeira bem rústica, com o título de “Bergentrückt – sagen aus der Anderswelt”, um conceito que não pode andar longe do velho “Hall Of The Mountain King” de Edvard Grieg, ou dos mitos germânicos wagnerianos, que no fundo ligam todas as temáticas lendárias por detrás da cultura ancestral dos povos desta zona europeia.
Mas é certo que num mercado relativamente condicionado, a obra dos STURMPERCHT só pode logicamente alcançar uma fatia altamente seletiva do público, em função não só do género musical a que se dedicam, mas também pelas edições limitadas, pelos acessórios e veículos que muitas das suas edições assumem (geralmente associadas a invólucros de madeira ou outros elementos naturais), perante uma juventude urbana cada vez mais subjugada à ditadura do consumo imediato e da música sem suporte físico.
Na alvorada de uma terrível revolução na indústria musical, em que a distribuição online ganhou à tradição de “fazer um disco - comprar um disco”, com a perda de direitos dos artistas que tudo isso implica, o acervo folclórico das edições dos STURMPERCHT é visto como um disparate pegado, uma palermice que, ironicamente, não é passível de ser facilmente arrebatada pelos novos barões da distribuição musical.
É simultaneamente uma jogada de resistência artística / estilística e um confronto directo, que assenta num pretenso falso elitismo de parte a parte. Até porque a música dos STURMPERCHT é mesmo puro folk ancestral e primitivo, tradição e preservação da identidade, que contraria e espicaça a atitude generalizada dos povos europeus de se deixarem colonizar inteiramente por modos de vida alienígenas, importados de lugares que mal têm História para contar, embora se arreiguem em estatutos megalómanos como “polícias do mundo” ou “nação de pedreiros livres”, etc e tal…
As razões e as fontes do trabalho deste móbil grupo de intérpretes do passado europeu mal conhecido, são praticamente filão inesgotável, pelo menos para o próximo século – há um orgulho saudável na forma como se cruzam pequenos apontamentos acústicos com o uso de uma tecnologia contemporânea, posta positivamente ao serviço da recriação mental dos arquétipos antepassados, e é dessa mesma fusão que resulta por vezes a sonoridade quase industrial, fortemente ambiental ou psicadélica de alguns temas dos STURMPERCHT e nomeadamente neste “Bergentrückt”. Num mundo ideal e justo, com a consciência pretensamente ecológica que as forças da nova ordem mundial nos pretendem impingir, os esforços de representação dos STURMPERCHT deveriam ser antes louvados pela sua autenticidade.
Todo o álbum, que dura quase 78 minutos, assume uma dinâmica narrativa que se encaixa na perfeição, dentro dos cânones sonoros a que nos já habituaram desde que em 2004 nos surpreenderam com “Sturm Ins Leben Wild Hineim” e no ano seguinte com o memorável “ Alpin Bann Und Segenssprüche”. São temas que nascem quase de forma espontânea, sobre uma base de droning que vai suportar frases melódicas de instrumentos de corda tradicionais, que se entrecruzam com montagens sonoras reveladoras e relevantes para a dinâmica narrativa imparável que o grupo desenvolve. Aliás, se algum epíteto os STURMPERCHT merecem é o de grandes contadores de histórias, estatuto que têm guardado zelosamente de há dez anos para cá.
Com tudo isto dito sobre este aparente último reduto da consciência folk europeia, a imagem do grupo som pode sair incólume e até reforçada – alguns dos seus membros são os homens por detrás dos discos de grupos que já provaram a sua probidade moral e arejamento ideológico (o próprio Max nos Rasthof Dachau, num permanente movimento contínuo pelo humanismo, Reynard Hopfe dos Stahlwerk 9, frontal opositor de vertigens neo-qualquer-coisa, e arauto contra os horrores do século XX, Gerhard dos Allerseelen, filósofo da terra e eterno viajante da Europa, o búlgaro Dimo Dimov dos fantásticos Svarrogh, paciente e perspicaz descodificador da matriz folk pan-europeia, etc.).
Meia dúzia de álbuns em dez anos provaram que é possível tornar a essência da Tradição e as lendas da Memória Europeia percetíveis para alguns milhares de pessoas através da Europa e do mundo. Nalguns casos, é no mínimo interessante ver alguma da juventude norte- americana entusiasmada com esta redescoberta; no máximo, é reconfortante acreditar que todo este esforço e perigos constantes não foram em vão, e que graças à música de grupos como os STURMPERCHT, e não só, um dia possamos constatar que as erradas mudanças operadas nos primeiros anos deste século implodiram sobre si mesmas, tal como as torres e castelos da quimera capitalista e usurária. E que um dia o Imperador adormecido sob a montanha possa acordar e reiniciar uma nova renascença, uma nova idade de ouro na Europa berço das ideias, livre de todos os malfeitores encartados e empossados. 

quinta-feira, 6 de março de 2014

Café Europa Radio Show #112, 06-MAR-2014 www.warfareradio.com

01. CAWATANA - "Untitled" (HUN) (63 days (part III) (w. der feuerkreiner) (sg) - 2005)
02. DER FEUERKREINER - "Untitled" (IT) (63 days (part III) (w. cawatana) (sg) - 2005)
03. MENACE RUINS - "Salamandra" (CAN) (alight in ashes - 2012)
04. LAIBACH - "The Whistleblowers" (SLO) (spectre - 2014)
05. ERMO - "Pangloss" (PT) (vem por aqui - 2013)
06. THROUGH WAVES - "A Ponte dos Mortos" (BRA) (santuario - 2012)
07. SID SUICIDE - "Saudade" (PT) (voltar - 2014)
08. MACK MURPHY & THE INMATES - "Lorraine" (LUX) (summer's cemetery dawns - 2004)
09. ROME - "The Torture Detachment" (LUX) (confessions d'un voleur d'ames - 2007)
10. NEBELUNG - "Innerlichkeit" (GER) (palingenesis - 2014)
11. BIRCH BOOK (w ANNELIES MONSERÉ) - "Song Of The Nightingale" (USA) (tangles of the vine - vpro session: august 24 2005 - 2006)
12. ROMA AMOR - "Love To Say Goodbye For"  (IT) (17.03 (ep) - 2012)
13. ROMA AMOR - "On The Wire" (IT) (on the wire - 2014)
14. DARKWOOD - "Stiller Bund" (GER) (the final hour - 2003)
15. DARKWOOD - "Secret Places" (GER) (schicksalsfahrt - 2013)
16. NEKRAINA - "Rose Clouds Of Holocaust (Di6 cover)" (UKR) (death in august - 2000)
17. NEKRAINA - "Silence as Christine (C93 cover)" (UKR) (death in august - 2000)
18. CURRENT 93 - "The Heart Full Of Eyes" (GB) (i am the last of all the field that fell - 2014)
19. CURRENT 93 - "Mourned Winter Then (vocals by Antony)" (GB) (i am the last of all the field that fell - 2014)
20. CURRENT 93 - " I Could Not Shift the Shadow (vocals by Nick Cave)" (GB) (i am the last of all the field that fell - 2014)
21. SOLANACEAE - "The Blood Of My Lady II" (DIN) (solanaceae - 2009)
22. PILORI - "Deos Timor Fecit (VMAT2)" (GER) (until the day dawn - 2009)
23. PROJECTO YESTERDAY - "September" (PT) (the waiting - 2014)
24. SPIRITUAL FRONT "Vengeur" (IT) (black hearts in black suits (special bag ed) - 2013)
Photos: AF
CURRENT 93
BIRCH BOOK