01. CAMERATA
MEDIOLANENSE - "99 AltriPerfecti"(IT)
02.
Ô
PARADIS - "Sopla!"(ESP)
03. BLACK
TAPE FOR A BLUE GIRL - "Love Of the Father"(USA)
04. OSTARA
- “Debt On Credit”(AUS)
05. OSTARA - “Paradise Down South”(AUS)
06. OSTARA - “Darkness Over Eden”(AUS)
07. OSTARA - “Heart On The Rock”(AUS)
08. OSTARA - “Garden Of The Rain”(AUS)
09. OSTARA - “Silent Symphony”
10. REGARD EXTREME - "Amour TeVolerai"(FRA)
11. DERNIERE
VOLONTÉ - "Les Orages Du Crime"(FRA)
12. STROMFÄGEL
- "Halesong"(SWE)
13. OSTARA
- “Story Of Lament” (AUS)
14. OSTARA - “Vagrant Heart” (AUS)
15. OSTARA - “Black Hole Of Light” (AUS)
16. OSTARA - “Wreath Made Hollow” (AUS)
17. OSTARA - “Dark Romance” (AUS)
18. OSTARA - “Lone Wolf Cry” (AUS)
19. OSTARA - “Havamal” (AUS)
20. COTARD DELUSION - "Ruins Of Culture"(PT)
21. KOKORI
- "Ashcending” (PT)
22. ERMO
- "Pangloss” (PT)
23. HEKATE
- "Idelia” (GER)
24. THE
BLUE HOUR - "The Night Is Windless” (USA)
25. ORDO
EQUITUM SOLIS - "Never Read Book)"(IT)
26. ROMA
AMOR - "Love To Say Goodbye For” (IT)
OSTARA “Paradise Down South”
Soleilmoon CD 2013
Muito se passou desde que Richard Levy sob o nome OSTARA
lançou o seu último disco de originais, “The Only Solace”, em 2009.
Mundialmente, todos sabiam que um buraco maior que o da camada de ozono, tinha
sido aberto nas finanças mundiais, e que tempos negros se aproximavam com a
ferocidade de um tornado de dimensões apocalípticas. Assim aconteceu e os
efeitos do choque não nos abandonaram. A indústria da música vive das boas
cores nas faces dos compradores e quando essa mesma indústria absorve toneladas
de ouro para as suas estrelas de plástico com saltos de meio metro e olhar
vítreo de manequim de montra, pouco sobra para os que ainda são capazes de algo
fazer em nome da Musa e das Divinas Artes.
A poesia e a beleza melódica foram sempre apanágio
descritivo da obra de Richard Leviathan, desde os tempos dos STRENGTH THROUGH JOY
até ao já referido “The Only Solace”. Leviathan, quer se goste dele ou não, tem
sido um dos mais hábeis obreiros e wordsmiths
do fenómeno neofolk, eivado da
substância powerpop que por seu lado
sempre condimentou os álbuns dos OSTARA. Em 2009, “TheOnlySolace” era um
bem-vindo sopro de frescura numa carreira que parecia algo encalhada, após uma
boa ideia semi-fracassada - o terceiro álbum de 2003, “Ultima Thule” - e uma má
ideia soberbamente executada, neste caso, o excessivo duplo álbum de 2005 “Immaculate
Destruction”, um disco com boas canções, recheadas, como a um peru de Natal,
com riffs e malhas hard rock sofisticadase uma
superprodução que parecia querer empurrar demasiado depressa o nome dos OSTARA
para uma ribalta mainstream que não
condizia com a ética artística de quem tinha criado “Secret Homeland” e “Kingdom
Gone”.
“The Only Solace” traduzia um estado de espírito que numa
espécie de acto de contrição, restabelecia os níveis de credibilidade de
Richard Leviathan junto da quase exigente comunidade neofolk internacional, que de uma forma bastante significativa,
registou esse excelente regresso à forma num momento em que tudo parecia
começar a desmoronar-se – bem vistas as coisas, o final da primeira década do
século XXI têm o sabor amargo de uma grande depressão, como se todos esses dez
anos tivessem sido em vão, como se a humanidade, após os acontecimentos que
mancharam indelevelmente a tal aurora de esperança para o futuro, nunca mais
tivesse encontrado os bons espíritos com que aparentemente tinham saudado a
chegada do ano 2000. Estamos em 2013 e esse fantasma negro ainda não se
dissipou sobre as nossas cabeças. E todos conhecemos a origem da maldição…
“Paradise Down South”, ao contrário da humildade de “The Only
Solace”, parece ter ganho fôlego ao longo dos iguais quatro anos que levou a
nascer. E, contudo, não é um disco marcado pelo ódio ao país onde se originou a
tal mancha que alastrou globalmente (a julgar pelo modo como Leviathan pontua o
tema “Darkness Over Eden”:
“I must confess to you I simply Love America, despite the ugliness and everything
about you we despise…”).
O disco começa com a enérgica “Debt On Credit”, um tema
cujo título fala por si, embora não necessariamente compaginado com o cânone OSTARA,
mas não sem, durante mais de cinco minutos, o que não é comum num tema de
abertura, alicerçar uma nova esperança para dias vindouros. Como se quisesse
estabelecer uma ponte com o passado, remetendo o verdadeiro início deste novo
trabalho para os temas seguintes. São temas fortes os que lhe sucedem, e tanto
o tema título como o magnífico e já citado “Darkness Over Eden” parecem
estabelecer uma nova norma e um novo padrão na forma OSTARA – doravante não
haverá mais barramentos estilísticos em nome de qualquer corrente filosófico ou
ideológica, ou por esse mesmo motivo, a vontade de os quebrar com aparentes
dessacralizações (vide “Immaculate Destruction”).
Os arranjos são por demais intensos e, com a produção
suave mas bem definida de David Lokan com o próprio Richard Leviathan, ajudam à
estimulação pop do ouvinte – não mais poderá o nome OSTARA estar alinhado com
qualquer sombra do passado épico darkfolk
dos STRENGTH THROUGH JOY. O triângulo sonoro voz-guitarra-teclas é a chave
constante do encanto deste álbum, com especial ênfase para os teclados que
conferem o contraste evidente às permanentes digressões vocais de Richard.
No entanto, existem sempre os perigos dos longos
alinhamentos que o formato CD permitiu há já mais de trinta anos – um disco de
cerca de uma hora, não tendo mesmo a intenção de ser um duplo LP conceptual,
caso fosse lançado em vinil, acaba invariavelmente por começar a cansar o
ouvinte, sobretudo quando existe uma componente estilística tão forte como a de
Richard Leviathan.
Não quer isto dizer que se trata de composição
bidimensional, o que nunca foi o caso dos OSTARA. Mas talvez por isso mesmo,
Leviathan segmentou bem este seu novo trabalho – seis temas novos garantem a
solidez na construção da ideia de álbum e ao sétimo tema descansa, com a
reposição de “Story Of Lament”, uma faixa repescada do injustamente malfadado “Immaculate
Destruction”, aqui retratado ainda mais suavemente, como um esboço à posteriori
do que deveria ter sido o espírito daquele trabalho.
Para trás ficam canções como “Heart On The Rock” e “Garden
Of The Rain”, suaves e vagamente reminiscentes da brisa lírica que dourava os
ares de “Secret Homeland”, especialmente a segunda, e também “Silent Symphony”,
mais rápida mas também mais radio-friendly,
a fazer ver que Leviathan na sua juventude não terá só ouvido The Church, The Go-Betweens
ou Triffids, mas também a sua boa dose de REM.
No entanto, e após esta breve memória, retoma, e bem, o
decurso de “Paradise Down South”, com dois temas absolutamente inesquecíveis,
conferindo-lhe um cunho simultaneamente cíclico e simétrico tal como acontecera
nos minutos iniciais – são eles “Vagrant Heart” e o belíssimo “Black Hole Of
Light”, que com “Darkness Over Eden”, constitue mos picos da cordilheira de
canções mais memoráveis de “Paradise Down
South”.
“Wreath Made Hollow”, o tema 10, inicia-se com uma das
habituais teias de guitarra e voz, lentas e ascendentes, e as linhas “No Beauty
Without Truth and No Glory Without Grief”, que de certa forma vão ao encontro
das três divas dos anos 20-30 que discretamente se insinuam na contracapa,
Marlene Dietrich, Anne MayWong e, claro está, Leni Riefenstahl, tema que está
de certa forma ligado ao seguinte, “Dark Romance”, que também conta com a
participação de Douglas Death in June Pearce nos E-bows.
O novo álbum está quase no fim e podia mesmo acabar aqui,
a caminho de concretizar mais uma confirmação para os OSTARA – a de que ainda
não estão em baixo e que não podem ser nem esquecidos nem ignorados no texto
global da música popular moderna. Se uma vantagem a sociedade de informação
voraz trouxe à humanidade é a descoberta quase instantânea e total de um
qualquer fenómeno sociocultural. Talvez ainda não seja tarde para o movimento neofolk fazer ver ao mundo as suas
razões – e ironia das ironias, foram as armas dos seus principais detratores a
contribuírem para a sua massificação!
“Lone Wolf Cry” é breve e talvez o momento mesmo mais
fugaz do álbum que fecha com uma melopeia nórdica, “Havamal”, texto da tradição
odínica, com música de Kyron Lazarus, mas que soa estranhamente a um ritual
índio americano. É com este sinal de estranheza religiosa e histórica que “Paradise
Down South” fecha.
Quatro anos passaram, quatro longos anos de
crise mundial e sobretudo europeia e a sul. O paraíso cá no sul não se fez
sentir de modo algum e nem assim acontecerá na próxima década – resta-nos a
única consolação de podermos ainda ouvir canções dos OSTARA, projecto musical
de um australiano que já viveu e trabalhou em vários países europeus mas que
gravou todo este novo disco em Adelaide, no sul da Austrália. Decididamente, um
outro Sul mais a Norte.