01. MANI DEUM - "Infected
Kittens" (GRE) (music
for your local church...or your local brothel – 2011)
02. MANI DEUM - "The
Cat And The Crow" (GRE) (music
for your local church...or your local brothel – 2011)
03. ATARAXIA - "Where
The Sea Turns Into Gold" (ITA) (ena – 2015)
04. ATARAXIA - "Le Nozze Di
Yis" (ITA)
(ena – 2015)
05. ROMA AMOR - "Una Torbida
Estate" (ITA)
(una
torbida estate - 2015)
06. ROMA AMOR - "A Tus Besos" (ITA) (una torbida estate -
2015)
07. ROMA AMOR - "Battiti - Cuore
Selvaggio" (ITA)
(una
torbida estate - 2015)
08. ROMA AMOR - "Lies" (ITA) (una torbida estate -
2015)
09. HYPERBOREI - "Summer
Time" (ARG) (the invisible army
– 2015)
10. NAEVUS - "Afters"
(GBR) (perfection is a process
– 2004)
11. ROMA AMOR - "Inverno" (ITA) (una torbida estate -
2015)
12. ROMA AMOR - "Mucho Mas Que
Ayer" (ITA)
(una
torbida estate - 2015)
13. ROMA AMOR - "Cinderella" (ITA) (una torbida estate -
2015)
14. ROMA AMOR - "Der Treue
Husar" (ITA)
(una
torbida estate - 2015)
15. EDO NOTARLOBERTI &
VIVIANA SCARINCI - “Se
Fosse Principio“ (ITA) (la favola di lilith – 2014)
16. EDO NOTARLOBERTI &
VIVIANA SCARINCI - "Ora
L’Intensità È Minore" (ITA) (la favola di lilith – 2014)
17. AEAEA - "Climb"
(USA) (drink the new wine
– 2014)
18. ANGELIC FOE - "Bewitching
Lilith" (SWE) (mother
of abomination – 2015)
19. ROMA AMOR - "Blau Blau Blau"
(ITA)
(una
torbida estate - 2015)
20. ROMA AMOR - "Il Cuore" (ITA) (una torbida estate -
2015)
21. ROMA AMOR - "Amsterdam" (ITA) (una torbida estate -
2015)
22. ROMA AMOR - "Tu … Ancora Tu"
(ITA)
(una
torbida estate - 2015)
23. SPIRITUAL FRONT - "No
Kisses On The Mouth" (ITA) (no
kisses on the mouth – e.p. – 2003)
24. INNER GLORY - "War
Is Forever" (ITA) (war
is forever – e.p. – 2002)
“Una
Torbida Estate”, dos ROMA AMOR,
marca presença neste outono de 2015, pouco mais de um ano sobre o antecessor “On the Wire”. Ao que naquele havia de
arrojo temático e sentimental, o novo ROMA
AMOR responde com determinação e aprumo estilístico, com a saborosa
confirmação daquilo que prevíamos na nossa conversa com o duo Euski-Candela em
Leiria no verão quente e não nublado de 2013 – que com uma produção mais
direcionada, o potencial musical do grupo poderia expandir-se muito mais que
proporcionalmente. É o que foi conseguido neste “Una Torbida Estate” – um primeiro trabalho de uma nova etapa na via
dos ROMA AMOR, sendo já o seu quinto
disco de originais, se excluirmos o mLP 10’’ “17-3, March17th”. “On the
wire” foi o culminar de todo um percurso castiço e navegado entre hostes
muito alternativas ou até divergentes – os ROMA
AMOR nunca se perfilaram no movimento neofolk europeu, fortemente
representado por bandas alemãs, no entanto, desde 2008 é documentada a sua
presença em diversos eventos próximos daquelas paragens musicais e o mesmo se
pode dizer em relação ao Entremuralhas, que sendo um festival nominalmente
gótico, acolhe “gatos vadios” da nova música popular como os ROMA AMOR.
Voltando
ao verão nublado deste novo álbum, retomando a ideia que existe, deveras, uma
melhor orientação da produção, com o tema título de abertura, é de imediato
gerada a sensação de um verão sulista, molhado e sufocante, musicalmente algures
entre as melhores memórias australianas de ‘80, como os Bad Seeds de Nick Cave
dos tempos de “Your Funeral My Trial”
e os Triffids de “The Black Swan” –
essa mesma dualidade entre sofisticação e desconforto, que se juntam para
enquadrar melhor a temática que vai alastrar a todo o álbum. Os ROMA AMOR são mestres nessa construção
de ambientes psicológicos que acusam a existência física das envolventes reais
ou sonhadas e neste caso são heróis românticos, talvez das resistências
políticas que mesmo assim se apaixonam por entre uma tempestade de verão. Com
este mote de tal forma sedutor dos nossos ouvidos e aquele efeito mistério dado
pelo som da chuva, será difícil ao ouvinte não se sentir motivado para a sequência.
Com
ROMA AMOR, outro sentimento ao qual
já nos habituámos é o da surpresa; os dois temas seguintes são de uma urgência
confessional assinalável – “A Tus Besos”
é em espanhol e faz por vezes lembrar a toada do austríaco Jurgen Webber e dos
Novy Svet, enquanto “Batitti- Cuore
Selvaggio” é mais canalha, mais canção de cantina, mais cabaret do povo,
numa letra que fala de corações selvagens cuja batida só a respiração pausará,
tudo interpretado com aquele languidez reativa a que Euski já nos habituou.
Esqueçamos
portanto a linearidade previsível dos álbuns que, embora bem produzidos, têm um
fito comercial – este decididamente não o tem. “Lies” é um tema de quase cinco minutos marcado por um ritmo
obsessivo mas balanceado, por vezes algo industrial, que contrasta com o gingar
do acordeão de Candela e com a voz rouca de Euski. É uma das duas canções
cantadas em Inglês neste álbum, já que há também duas em Espanhol e ainda outra
em Alemão, e ainda outra que se divide pelo italiano, inglês e alemão. É assim
a versatilidade poliglota dos ROMA AMOR,
sendo também um reflexo do evidente carisma europeu da sua música e poemas.
E
chegados praticamente a meio do álbum encontramos “Inverno”, que nos entra pela casa adentro, com um som de violino
verdadeiramente espectral que nos é de algum modo familiar – é claro que é Matt
Howden que dá uma achega com momentos de autêntica invernia sonora, pontuado
pelas palavras de Euski que anuncia a chegada da estação. Mas este inverno nada
tem de agradável, do reconfortado desconsolo que faz dele uma estação para
elitistas e misantropos. É uma carta esquecida e amarelada, como urina na neve,
que motiva uma lembrança amarga e que faz aparecer o nome de alguém escrito nos
vidros embaciados – e então, já não é só lá fora que chegou o inverno... O
seguinte tema em Espanhol, “Mucho Mas Que
Ayer”, é como que uma continuação de “A
Tus Besos” e mesmo que, musicalmente, seja o primeiro momento relativamente
indiferente, haverá motivo para não os confundir com uns quaisquer Vaya Con
Dios da facilidade mercantil. As palavras balbuciadas por Euski sopesam o seu
próprio receio por um amor perdido, descrevem o medo também pela vida do outro,
num trecho simultaneamente confessional e obsessivo, que faz a ponte para o
outro tema em Inglês “Cinderella For One
Day”.
O
título é uma piscadela de olho óbvia a um dos heróis de Euski – David Bowie. É
quase pena que o tema seja tão curto em comparação com os anteriores. A “sujeita
poética” pede apenas que a deixem ser Cinderella por um dia, numa declaração de
submissão total que a faz andar de cá para lá, quase exausta, dormindo em
comboios cujo silvo já só lhe relembra beijos. E de repente damos connosco a
escutar Euski interpretando velhos tradicionais folclóricos europeus – a
brilhante “Der Treue Husar”, em três
línguas, de estrofe para estrofe (inglês, alemão e espanhol), e a lenga-lenga
escolar alemã, “Blau Blau Blau”, que
anteriormente tínhamos ouvido às gémeas norte-americanas Prussian Blue.
Conhecendo a diametral oposição entre tão díspares universos femininos, só pode
ser provocação – uma nursery rhyme do
século XIX que fala do amor em todas as cores e que poderá funcionar como disclaimer relativamente ao seu
verdadeiro sentido, já que se adivinhava, no mínimo, uma certa distorção
política na versão das jovens Prussian Blue.
Chegamos
assim ao último quarto de Um Verão Nublado – e mais uma vez podemos observar
como dominam uma abordagem ao simbolismo microcósmico – o “Cuore”, o coração, é o centro do tema assim intitulado, com uma batida
cardíaca que introduz o momento talvez mais atmosférico do álbum, embora bem
marcado pelo ritmo dançarino no acordeão de Candela. É necessário não esquecer
que este ainda é um disco com selo Old Europa Café, portanto tudo o que vier “out of the box” é simplesmente natural.
E tão natural, tão com os pés na terra, que finalmente deparamos com a versão de
“Amsterdam”, de Brel, a qual já lhes
conhecíamos desde pelo menos Agosto de 2013 em Leiria, na edição desse ano do
Festival Entremuralhas, onde a prestação do duo arrancou a alguns dos muitos
presentes “Bravos” exaltados. Porque já não é uma surpresa, poderá não surtir
aquele efeito de choque para os que a ouviram ao vivo, no entanto não retira
absolutamente nem uma batata frita à ementa daquele marinheiro cujos dentes
apodreceram demasiado cedo. Sem dúvida uma das melhores versões do eterno
clássico, e vejam lá bem que nunca foi qualquer um que se aventurou a fazê-lo.
Chegamos
ao fim. Falta um tema. Uma canção intitulada “Tu Ancora Tu”. Ouve-se o mar, ou talvez uma respiração, e um piano
digno de Mick Talbot dos Style Council. Será a costela Style Council dos ROMA AMOR? É subjetivo, claro, mas
estamos em crer que, a conhecê-los, Paul Weller haveria de gostar bem dos ROMA AMOR. É apenas um tema de fecho de
cinco minutos, mas que absorve em si toda a carga nostálgica romântica do
álbum, fenómeno atípico que por vezes é conseguido pela gente que tem deveras a
mestria de fazer canções. Repetimo-lo – não é para todos, tornar aquilo que
parece mais um simples apontamento segmentário numa espécie de fantasma de
canção que se impõe, que se revolta no marulhar daquilo que pareciam ondas mas
que, com a aproximação do fim, já se confunde numa trindade em que a respiração
de alguém e a chuva lá fora parecem alargar o espectro poético e musical da
canção, que não é mais que uma história de reencontros apesar de tudo - apesar
de tudo! - até de verões nublados e chuvosos.
Os
ROMA AMOR estão aí, de pedra e cal,
fantásticos e rebeldes menestréis da canção Italiana. Continuam únicos,
originais e no entanto todos os podem entender e mais, gostar deles. Lá está –
paradoxalmente, não é para todos.
Texto:
João Carlos Silva