02. ERMO - "Destronado" (PT) (ermo e.p.
- 2012)
03. ERMO - "Pangloss" (PT) (vem por
aqui - 2013)
04. DUO NOIR - "Have You News OfMy Boy Jack?" (GB) (sintra - 2010)
05. DUO NOIR ( (w. Paulo
Rinhonha as speaker) - "Recessional" (GB/PT) (sintra -
2010)
06. ANDREW KING - "Interview w. Café Europa - Part 1"
07. ANDREW KING - "Cruel Lincoln"(GB)(the amfortas wound - 2003)
08. ANDREW KING - "Froleichen So Well Wir" (GB) (7" split w/blood axis - 2010)
09. THE TRIPLE TREE - "The Ghosts Of England" (GB) (ghosts - 2008)
10. ANDREW KING - "Interview w. Café Europa - Part 2"
11. ANDREW KING - "Corvus Terrae Terror" (GB) (deus ignotus - 2011)
12. ANDREW KING - "The Three Ravens" (GB)
(deus ignotus - 2011)
13. ANDREW KING - "Judas" (GB) (deus ignotus - 2011)
15. ROME - "Lullaby
ForGeogie" (LUX) (a passage to rhodesia - 2014)
16. SPIRITUAL FRONT - "I Just Can't Have Nothing" (IT) (black hearts in black suits - 2013)
17. NAEVUS - "Beth
Gellert" (GB) (others - 2013)
18. ONIRIC - "The
Echoes Of The Sky" (IT) (cabaret syndrome - 2009)
19. DEATH IN JUNE - "All Pigs Must Die"(GB) (live in wien - 2012)ANDREW KING w. CAFE EUROPA |
Café Europa com Andrew King
Lançámos a questão acerca da dificuldade inicial de qualificar os
primórdios musicais de Andrew King, de forma a ser útil para os interessados na
sua música. King rapidamente fez o retrato do passado, desde a sua estreia na
compilação Aum, organizada por Tony Wakeford, com “The Hobby Horse on Mayday in
Minehead”, e depois com a sua ligação a Andrew Trail, dos Knifeladder. Os
tempos que dariam origem ao primeiro álbum, “The Bitter Harvest” tiveram lugar
antes da explosão da banda larga e portanto as dificuldades em licenciar
material tradicional da sua origem eram bastantes. A sua parceria com Trail
levou-o ao conhecimento de outro elemento dos Knifeladder, Hunter Barr,
encontrando assim a hipótese de gravar num estúdio, mesmo que limitado.
Na realidade, “The Bitter Harvest” foi gravado num velho 4-pistas de
cassetes de crómio, com um som que obviamente traduz a rudimentaridade do
processo. A World Serpent Distribution de David Gibson e Alan Trench não quis
distribuir o álbum na altura e “The Bitter Harvest” acabou lançado e
distribuído pela Epiphany. Poucas faixas foram alvo de multi-tracking ou de overdubs,
pelo que no geral, King também o considera um disco fraco e incipiente. Há no
entanto um valor intrínseco nesse trabalho, sobretudo na forma como a tradição
oral é tingida de tons industriais, com drones
intemporais que conduzem a uma intensa mostra de força. Mesmo assim os seus detratores
consideram-no como um primeiro falhanço na afirmação definitiva do nome de
Andrew King. Mas, numa visão retrospetiva, essas gravações hoje em dia, parecem
fazer todo o sentido. King admite que não teria chegado até ao álbum seguinte, “The
Amforta’s Wound”, sem todo esse caminho de aprendizagem. Teria sido melhor não
o lançar? Nesse caso, teria sido de imediato reconhecido com um trabalho de
calibre, já com algum conhecimento dos meandros das gravações e possivelmente
teria tido a oportunidade de regressar a alguns temas de “The Bitter Harvest”.
A via musical de Andrew King cedo revelou habilidade para sintetizar o dark-folk tradicional e a veia mais
industrial/ambiental, levando este cruzamento mais além que outros dos seus
correligionários, como os Sol Invictus ou os Blood Axis. De certo modo, é uma
afirmação de nunca estar disposto a imitar alguém e de seguir um caminho seu –
teria sido esta também a sua motivação aquando da sua passagem pelas Belas
Artes, ou nas suas palavras, pelas Artes Visuais?
Em Inglaterra, as artes visuais estão dominadas pelo marketing, não
importando se se é bom ou mau, o que interessa é o que se pode fazer para
melhor se vender. Andrew King passou por uma escola superior de artes muito
conceptual que visava levar os seus alunos a pertencerem ao que se denominou Brit Art, mas a qual falhava no ponto de
indicar o modo como o artista se deveria inserir no mercado, daí julgar que o
meio musical é mais honesto que o da arte visual.
ANDREW KING @ Entremuralhas'14 |
Em relação aos Estados Unidos, onde Andrew King realizou duas exposições a
solo, concluiu que não são tão condicionadores das artes visuais, no sentido em
que aceitam os artistas que acreditam no que estão criando. O lado negativo é
que se trata de um mercado antiquado e de que o valor de algo pintado depende
muito de ser a preto e branco ou a cores, ou de ser grande ou pequeno. E uma
vez que ele produz peças pequenas e a preto e branco, isso tornou-se um
problema e tornou-se caro fazer a própria exposição; nas Ilhas Britânicas, a
sua arte simplesmente não encaixou. Daí que se tenha focado na música, porque
aí pelo menos as pessoas querem saber o que se está a passar. Felizmente que o
livro sobre as suas pinturas veio criar de novo algum interesse, mas mesmo isso
não lhe terá renovado as esperanças de ser reconhecido nos meios das artes
visuais.
Para o leigo, vagamente interessado nos mestres da pintura como Bosch,
William Blake ou Edvard Munch, é possível encontrar pontos de referência. Será
Andrew King, enquanto artista, capaz de reconhecê-las e usá-las como motivação
estética, ou de certa forma, como processo alquímico que iluminaria os caminhos
desse mundo simbólico que expressou. Com efeito, King admite que ambas
hipóteses são verdadeiras e o mesmo se aplica à música. O processo pode durar
semanas ou anos; as coisas não acontecem assim da noite para o dia. As
influências circulam em ambos os meios de expressão e sente-se por isso muito
contente por as reconhecer. Evita contudo ser demasiado óbvio, a menos que seja
por pontos específicos que tenham ou devam ser assumidos.
Quisemos ainda questionar Andrew King sobre a sua tendência monocromática
nas pinturas que incluiu no livro “Emblematic Paintings”. Caso para dizer que
por vezes criados efeitos luminosos que parecem sugerir cores pastel por entre
os traços. King ri-se e afirma que são predominantemente escalas de cinzento,
sombreadas. No entanto, não se coíbe de referir a pintura que veio a ser a capa
do álbum “The Amfortas’ Wound” – enquanto usava um “xis-ato” no manuseamento
das tintas, cortou-se e algumas gotas de sangue espalharam-se no centro do
quadro. Pensando que isso era algo predestinado a acontecer, deixou-as ficar, tendo-se
tornado depois acastanhadas. Tudo por acidente.
ANDREW KING @ Entremuralhas'14 |
Mudando de assunto, focámos de seguida a nossa conversa nas várias colaborações
que Andrew King desenvolveu desde 1998; algumas com bandas líderes do movimento
Neo-Folk, mas outras também menos
ortodoxas como os franceses Les Sentiers Conflictuels e os britânicos Brown
Sierra. Tal rácio de colaborações é digno do Guiness Book Of Records. Quisemos
saber com essas colaborações tomaram forma – em estúdio ou simplesmente através
das facilidades da internet. No que diz respeito ao disco “1888” com os Les
Sentiers Conflictuels, Andrew e Philippe nunca se tinham visto e isso não foi
planeado, foi apenas o decurso natural dos factos. A troca de registos aconteceu
durante os primórdios da banda larga e a quase totalidade da música desse álbum
é da autoria do francês; King só vocalizou e deu sugestões de acabamentos
estéticos, nomeadamente no uso de gravações de época, feitas ainda nos
cilindros de cera inventados por Thomas Edison. Andrew King gostaria de levar
ao palco o álbum “1888”, tal como aconteceu com “Absinthe” dos Les Joyaux De La
Princesse com os Blood Axis, mas esse tem sido um plano já com alguns anos e
ainda não houve oportunidade para tal, sendo um registo em tudo semelhante e
propício a um acontecimento ao vivo, embora não haja qualquer certeza de que
acontecerá. Aliás, a referência a este estranho mas marcante álbum suscita a
nossa próxima questão: sendo King um nome ligado ao Dark-Folk novo-tradicionalista nunca teve problemas em usar
abundantemente drones industriais
como pano de fundo. Nesse caso até que ponto o ruído gerado eletronicamente se
poderá misturar com uma visão neotradicionalista do Mundo? King diz que tudo
depende – as canções acompanham o ritmo e a métrica da língua em que estão
escritas, e no seu caso isso não lhe permite construir uma canção baseada em
batidas repetitivas. Salienta o caso de “Judas” do álbum “Deus Ignotus“ que
considera algo repetitivo, mas na qual consegue tecer uma narrativa à sua
volta. Para si, qualquer tipo de eletrónica constrange o texto e isso ele
evita-o. O texto tem que ser supremo. Daí que, sim, estabelece limites para
aquilo que é simplesmente incompatível, algo que por vezes só se vem a saber já
dentro estúdio. Nesse pé, seria então possível que, ainda que remotamente, as
texturas ruidosas de nomes clássicos como Throbbing Gristle ou SPK (dos quais
fez parte o próprio John Murphy, que acompanha King ao vivo) pudessem de algum
modo tê-lo influenciado? Obviamente, o conceito de que musicalmente, qualquer
coisa há de funcionar, foi muitíssimo libertador para a sua geração, e ter
alguém como Murphy a tocar tambores para si representa um largo bocado da
história. O potencial musical de um baterista como John Murphy tem por vezes de
ser refreado e é por isso que lhe lembra que em certos momentos menos é mais.
Se Murphy usasse sempre toda a sua versatilidade rítmica, acabaria por
distraí-lo ao vivo. Nalgumas peças como em “The Stripping of the Altars” em que
não há um ritmo específico, e outras com sonoridade mais abstrata, essa questão
não se põe, mas nos temas com o harmónio em que um certo ritmo que ser mantido
tem que lhe exigir que toque menos, o que é de facto um tremendo desperdício,
para tão grande músico. Mas ele compreende como as coisas funcionam. Quando
fizeram a digressão com os Blood Axis, John Murphy tocava nos dois sets, e os
Blood Axis deixavam-no soltar-se, improvisar, o que o levava a pensar que não
usufruía o suficiente dos seus préstimos enquanto músico. Andrew King não se vê
como um músico, mas antes como um vocalista. Alguém que canta, e se permitisse
que John Murphy soltasse toda a sua garra, acabaria por desconcentrá-lo.
Foi preciso esperar cinco anos para lançar o segundo álbum “Amfortas’
Wound”; será esta a derradeira afirmação da qualidade sobre a quantidade?
Habituar os ouvintes a longos intervalos entre lançamentos de discos de
originais? Obviamente que ficou contente com o som desse álbum, ao passo que,
como virmos o primeiro era ainda um disco de aprendizagem. Havia uma audiência
que visivelmente respeitava esse segundo álbum. O neo-folk tornou-se um género muito abrangente, sem fazer crítica a
isso, mas muitas bandas o que fazem são canções simples e acústicas. Daí que
King ficasse feliz por trazer um pouco do seu conhecimento académico
especializado para dentro da cena, e por as pessoas ficarem interessadas, o que
lhe custou um pouco, dado que certos invejosos lhe levantaram problemas para
trazer esse input para a cena. Quanto
à exigência que deriva dos intervalos entre lançamentos, existe de facto uma
preocupação com o controlo de qualidade, e se isso implica longos períodos de
tempo, que assim seja. O espaço entre “ The Bitter Harvest” e “Amfortas’ Wound”
resulta também de um período de convalescença de um problema de saúde; os oito
anos que medeiam entre aquele e “Deus Ignotus”, foi porque ao longo dos anos
houve outras gravações, e porque alguns dos seus trabalhos têm uma direção
específica, dá-se à liberdade de deixar as canções desenvolverem-se como que
organicamente, e se isso implica 6, 7, 8 anos, então que assim seja.
O tempo será por isso uma ferramenta para deixar as canções apurarem, mas
algumas gravações intermédias foram relativamente rápidas, porque havia razões
externas que assim o ditaram, por exemplo o CD a meias com os Changes, na
editora nacional Terra Fria, ou até mesmo o mini LP de 10 polegadas. Mas regra
geral gosta de fazer os seus trabalhos o melhor que pode e, com “Deus Ignotus”,
foi esse o caso. Quanto ao próximo, “The Tower of Pride”, sobre a Primeira
Guerra Mundial, os seus planos são mesmo lançá-lo ainda em 2014. Mas há sempre
questões de logística; um dos temas terá a participação dum amigo que executará
uma peça num órgão de catedral anglicana na Índia, onde se encontra a viver, e
tudo isto leva tempo a preparar. A versão de “Recessional” que há-de aparecer
em “The Tower of Pride” vai implicar a participação vocal de 20 pessoas
diferentes, de vários países e até ao momento ainda lhe faltam algumas partes.
A feitura de “The Tower of Pride” implicou pesquisas acerca dos célebres poemas
sobre a Primeira Guerra; alguns deles estavam excluídos à priori, mas outros
tinham necessariamente de aí figurar, por diversas razões. Depois foi preciso
planear a forma como os temas seriam feitos, algumas só canções simples, como “Army
of Mercenaries”, outras mais abstratas, como “The Stripping of the Altars”,
outras ainda são exatamente gravações ambientais de campo. Haverá algumas peças
mais “ruídistas”, mas tudo isto leva Andrew King a racionalizar que o próximo
disco de originais poderá eventualmente sair em 2015 e já não este ano.
Falando depois sobre a sua longa permanência nos Sol Invictus, como
convidado especial, é significativo saber um pouco mais sobre esta sua
experiência; King sempre assumiu que os Sol Invictus são a banda de Tony
Wakeford e que sempre que ele não quer trabalhar mais com alguém, é assunto
seu. Mas o que lamenta mais na sua estadia de mais de cinco anos com os Sol
INvictus é o facto de não ter sido feito um álbum à maneira mais tradicional do
grupo, admitindo que a sua última participação em The Cruellest Month o deixou
algo insatisfeito. Ainda por mais, a editora Prophecy insistiu na organização
da caixa retrospetiva dos álbuns iniciais e que não se envolveria no lançamento
de material novo, antes do boxset
estar pronto. Em temas como Cruel Lincoln e Edward, ainda tentou essa via mas o
material seguinte já se afastou de novo da orientação tradicional.
Falando ainda de colaborações, é de sublinhar o carácter de quase hit-single que o 7” split com os Blood Axis alcançou há uns anos atrás, o qual, inclusive, já se encontra esgotado há muito. Modestamente, King assume que o sucesso se deve ao tema dos Blood Axis, “The Dream”, e não ao seu. A ideia foi sugerida por Annabel Lee, e logo houve concordância, pelo facto de ambos estarem à altura a trabalhar em poemas medievais alemães, dos chamados Minnesänger, para os respetivos álbuns em progresso. Como não há muita gente que honestamente os fossem capazes de reproduzir, achou-se boa ideia dar-lhes uma mistura diferente e lançá-los em single. Mas não havia material semelhante suficiente nem para um mini álbum, dado que os temas eram partes integrantes de dois álbuns diferentes. Os temas medievais alemães não assim tão conhecidos pelo público folk britânico. Para além disso, assumem uma musicalidade algo difícil que se pode tornar aborrecida, estando constantemente sob a tutela do trabalho académico que impõe regras estritas sobre como devem ser interpretadas; já a poesia tardia da Idade Média germânica é bem mais interessante e vivaz, mais na linhagem trovadoresca. Daí ele ter arriscado na interpretação em Alemão Antigo, com a ajuda de amigos austríacos. Tê-lo-ia preocupado mais se fosse em Francês ou Italiano, embora tivesse já participado com os Àrnica, para o qual contou com ajudinha da esposa que é catalã.“Deus Ignotus” terá sido definitivamente o seu trabalho mais completo, não só ao nível literário, mas também em matéria de qualidade de som, pese embora ter saído em 2011; tem soado como um disco crescente ou mesmo permanente nos leitores de CD dos seus admiradores. Andrew King faz o rappel do andamento das gravações que conduziram ao seu terceiro trabalho de longa duração. “The Three Ravens” foi parcialmente gravado com John Murphy, há já alguns a
ANDREW KING w. CAFE EUROPA |
nos, mas com a inclusão ou adição de outras variantes de percussão, o tema seria facilmente uma peça de abertura; depois gastou algum tempo com o manuscrito de “Judas”, o qual tinha a certeza de incluir no álbum, e ainda algumas outras peças. Por exemplo, “Lord Lovel” é a gravação mais antiga presente em “Deus Ignotus” – é do período de “Amfortas’ Wound”. No entanto, como foi um muito bom take, King decidiu usá-lo. O texto de David Jones, “In Upper Room” era mais outro tema na sua cabeça, e ao qual mais tarde deu acabamento, mas custou-lhe uma fortuna em direitos; ao contrário de outros autores cujos representantes tinham generosamente cedido autorização graciosa, a Faber & Faber pratica preços de copyrights que são autênticos rombos no orçamento, e pagar cerca de 500 libras para interpretar e imprimir um texto num álbum não está ao alcance de todos. No entanto, King relembra o episódio do contrato que chegou com um preço inflacionado de £850,00, mas que num smallprint do recibo ainda trazia o preço anterior. Daí à negociação foi pelo menos um passo saboroso de o feitiço se virar contra o feiticeiro, e a Faber & Faber cedeu nos seus propósitos quase dignos da usura medieval. De resto fica o aviso para os admiradores, “The Tower of Pride” ao incluir textos cujos direitos de autor são igualmente proibitivos, não irá incluir folha de líricas, embora sejam referidos os títulos e respetivos autores. Como remate desta reveladora conversa com Andrew King, e numa nota final que de rodapé tem pouco, ficaram as palavras do seu apreço pelo Festival Entremuralhas e pelo Castelo de Leiria que só então descobria e onde nos brindou com um espetáculo inesquecível, mau grado uns insignificantes problemas de som ao início.
ONIRIC @ Entremuralhas'14 |
ONIRIC @ Entremuralhas'14 |
Sem comentários:
Enviar um comentário