quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Café Europa Apresenta:ELIWAGAR "Sagn Fra Nordafolkets Land"

ELIWAGAR
Sagn Fra Nordafolkets Land
Nordafolk Records, NF001, 2011
CD, Album, Limited Edition, A5 Digipak - Norway

Acima do nevoeiro e do mar furioso, bem longe, lá a Norte, fica uma terra entre fiordes e montanhas, onde o sábio espírito dos ancestrais nórdicos ainda vagueiam por entre as profundezas das florestas…
 A história deste disco poderia bem começar assim, tão próximo está o duo folk norueguês Eliwagar de todo o acervo lendário daquelas paragens. Para alguns é já uma imagem gasta, após mais de vinte anos de black metal norueguês, com todas as suas tenebrosas lendas de feiticeiras vivendo em cabanas à beira dos fiordes. Bom, neste caso, é importante que o ouvinte se concentre na música e esqueça por momentos a forte componente visual em que os Eliwagar apostam (ancestral, fortemente tradicional). Aliás, é bem mais interessante esse percurso inverso, dado que as onze canções que interpretam em menos de quarenta minutos, falam por si, são extremamente visuais e apaziguadoras dos sentidos.
A folk milenar dos Eliwagar incorpora dos momentos de maior frescura e brilho recentemente saídos das paragens escandinavas. “Sagn Fra Nordafolkets Land” é já o quinto registo dos Eliwagar, se nesta conta incluirmos a K7 de 2007 “Crépuscule d’une âme paienne”, à qual seguiram os cd’s “Memories of the Warrior’s Will”, “And the ancestral pagan flame shall never fade” e depois os álbuns com títulos em Norueguês, “Fjellfolk Saga fra Forntiden” e este “Sagn Fra Nordafolkets Land”.
Numa velha quinta nessa ancestral terra vivem Runahild Fyorgynsdottir e Bjorn Nord, tocando e cantando folk musica nórdica a que eles chama, com toda a razão, romântica, em honra dos velhos contos populares e do folclore naturalista, saudando os seus pais ancestrais com as suas canções que ressoarão nos profundos vales e subirão até aos céus eternos da Noruega, para que essa ancestral herança nórdica nunca desvaneça…
Qual é o segredo musical dos Eliwagar? Quase nenhum. Apenas a voz fresca de Runahild, ora em solo ora com harmonias criadas, uma guitarra acústica de doze cordas, alguma suave percussão local, e o seu trunfo principal, o Hardingfele, uma rabeca secular norueguesa de oito cordas – às vezes nove – instrumento de que ainda resistem exemplares do século XVIII, e que funciona de forma diferente do violino comum. As cordas são mais finas e metade delas são apenas para a ressonância das notas marcadas nas restantes quatro; para além disso, o Hardingfele possui uma ponte mais baixa, permitindo ao executante maior variedade de acordes e facilidade na amplitude tonal. O resultado final, neste caso, é o equivalente a uma viagem relâmpago no tempo até às sonoridades ancestrais da Noruega e da sua folk mais tradicional.
Para se libertarem de pressões, Runahild e Bjorn criaram o seu próprio selo, Nordafolk Records, com o fito de unicamente divulgar música nórdica, com um espírito profundamente alicerçado na natureza do Norte e com um amor genuíno à herança cultural e ao seu folclore; de momento ainda não há outros projectos assinados, mas assim pode acontecer no futuro.
Para falar verdade, e pelo mise en scène que as capas dos discos de Eliwagar deixam transparecer, existe mesmo uma vontade de ferro em não deixar escapar nada da tradição nórdica, desde as vestes, ao cenário natural grandioso em fundo. Também a força e alma com que os temas são interpretados deixam adivinhar um forte empenho numa resistência tranquila contra o fenómeno da globalização. A globalização que por si, não é boa nem má, apenas é mau o uso que fazemos dela, sobretudo se em função do modo de viver e pensar em megalópolis como Nova Iorque ou Tóquio, passarmos a esquecer quem somos, a nossa identidade ancestral. Acontece aqui, acontece aqui ao lado, acontece lá em cima. Todos estamos a ser arrastados para um buraco negro civilizacional e, em nome de coisas como o “politicamente correto”, estamos a deixar-nos colonizar culturalmente por invasões sucessivas de poderios alheios que extinguem aquilo que em tempos já fomos. Daí que o fenómeno de recuperação do ancestral seja muito mais que um movimento retrógrado, ou muito mais do que aquilo que mentes entorpecidas julgam ver nas suas manifestações culturais e folclóricas. Se o olharmos de frente, poderemos não só mirar o passado, como talvez o futuro. Estas palavras são válidas para cada nação europeia, do atlântico Portugal à mediterrânica Grécia, da montanhosa Confederação Helvética à abismal e verde Noruega.
Escreve Runahild na página oficial dos Eliwagar:
“No topo do monte sente-se o odor do fumo da madeira de bétula a arder, que vem das chaminés das nossas casas de madeira, um cheiro familiar para nós, vivendo nas montanhas da costa oeste, rodeadas de densas florestas”.
E mais à frente:
“Agora é tempo de descansar, nesta velha quinta. Cortar lenha de bétula para o ano que vem, dar de comer aos animais, limpar os campos circundantes para a Primavera que se avizinha e passar os serões à lareira, a tocar música e a saborear bom vinho e cerveja da nossa produção, enquanto o gelo lá fora abraça a Natureza. Skadi, a robusta beleza do Inverno, e Ullr o deus caçador, deixaram os seus altos domínios de montanha e desceram ao vale, esquiando por entre as bétulas e, cantando com o vento forte, trazem-nos paz aqui na quinta.”

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